Apito Dourado - o ruir do actual edifício arbitral em curso
Das batatas ao futebol tudo é negócio...
Os ditos telefonemas, escutados pela Polícia Judiciária (PJ), têm sido uma importante base de trabalho do processo "Apito Dourado" e já levaram às instalações da PJ quase todos os juízes das várias categorias da arbitragem e alguns deles já foram constituídos arguidos. A Augusto Duarte - o único árbitro da primeira categoria que se encontra suspenso da actividade - juntaram-se no decorrer do último mês Paulo Baptista, Carlos Xistra, Lucílio Baptista e Paulo Paraty.
Alguém se enganou quando
lhe disseram ser árbitro
Contactados pelo DN, os dois primeiros limitaram-se a afirmar que não queriam comentar o assunto, enquanto Lucílio disse apenas ter sido ouvido na "qualidade de árbitro", e Paraty só confirmou ter prestado declarações.
Mas estes juízes constituem apenas um pequeno grupo de um processo que já conta com perto de uma centena de arguidos e no qual já foram ouvidas cerca de 500 pessoas nas instalações da PJ de norte a sul do Continente e na ilha da Madeira. O DN sabe que a maioria dos interrogatórios aos árbitros têm como ponto de partida telefonemas de Valentim Loureiro - actualmente com a actividade na Liga suspensa desde Abril de 2004 - feitos antes e depois de jogos. O telefone do major tocava também para alguns dirigentes responsáveis pela nomeação de árbitros, interessado em saber quem iria ser o juiz de determinados encontros.
Paulo Baptista, de Portalegre, e Elmano Santos, da Madeira, foram alguns dos visados com a "curiosidade" e também com a "irritação" de Valentim - ao que parece não se coibia de mostrar o seu descontentamento com as exibições dos árbitros. Nestas duas situações houve um factor comum jogos em que o Boavista foi interveniente, defrontando o Guimarães (Paulo Baptista) e Benfica (Elmano).
O centro da nossa derrota
no jogo do Dragão
É, pois, num verdadeiro clima de desconfiança e descredibilidade que os árbitros continuam a ser, semanalmente, designados para os jogos da Superliga. Uma situação que não incomoda Luís Guilher, presidente da Comissão de Arbitragem da Liga (CA) e o único elemento deste órgão que ainda não foi ouvido. "O caso não está a condicionar a nomeação de árbitros", diz. Nas palavras de Guilherme, a "CA não anda nem pode andar atrás das notícias de jornais", pelo que só mediante ordem judicial é que qualquer árbitro envolvido no processo deixará de ser nomeado. Como tem acontecido até agora.
O "Apito Dourado" já teve um mérito. Afinal, é mesmo verdade o sistema existe e é feito de promiscuidades e favores. Por aquilo que se vai sabendo, este processo não deixará pedra sobre pedra no edifício da arbitragem portuguesa. Nada poderá voltar a ser igual. Deixando claro algo que já era uma evidência a necessidade de uma profunda regeneração no futebol português. Uma regeneração que, pelo que se tem visto, nunca se fará por dentro do sistema, e que terá de ser imposta de fora, através de alterações legislativas e, mais importante, de vontade política nesse sentido. Nesta matéria, futebol, o poder político em Portugal tem, desde sempre, optado pela mais cobarde das atitudes, assobiando para o ar, como se nada se passasse, em nome da crença numa auto-regulação que, já se provou à saciedade, nunca funcionará.
Uma das provas, só mais uma, da falência total da auto-regulação é a maneira como a Comissão de Arbitragem da Liga, chefiada pelo inefável Luís Guilherme, tem gerido tudo o que tem a ver com o "Apito Dourado". Não percebendo que existe, desde já, uma questão moral, antes da própria questão legal.
Luís Guilherme
Em fase de trituração contínua
Fonte do texto: Diário de Notícias, de 2005/03/04
Imagens seleccionadas na Comunicação Social não desportiva pelo editor, nomeadamente no "Jornal de Notícias", o qual contém episódios hilariantes e grotescos deste caso.