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Safari de caça aos leões... em época baixa



No momento que vivemos é quase irresisistível não abordar as eleições ou o panorama geral da época que decorre, marcado pela última eliminação da Taça. Se sobre as eleições reservo a publicação de artigos próprios (na continuação do primeiro, “Mudar as Mudanças”), hoje não consigo contornar o segundo ponto. Ficará para o final deste artigo, que como poderão imaginar será mais outro da série de antevisões.
Curiosamente iniciei essa série na 1ª volta, precisamente por ocasião do Sporting-Belenenses. Dessa forma e até ao final da época pouparei algum trabalho, pois muito do que teria a dizer sobre os clubes adversários já foi dito.

Assim sendo o artigo de hoje será uma espécie de parte segunda em relação ao artigo do Sporting-Belenenses (ver artigo em nova janela). O clássico de hoje é derby antigo com uma história repleta de peripécias. À semelhança do primeiro artigo, a análise de hoje passará pelos jogos “históricos” mais relevantes, o resumo dos resultados e os últimos encontros efectuados.

Ao olhar para a história dos Belenenses-Sporting, um jogo salta logo à vista. Um encontro infame que marcaria para sempre o Belenenses, toda uma geração de Belenenses e as relações com o Sporting. Poucos terão sido mais trágicos.
Estou a falar obviamente da última jornada do campeonato de 1954/55. É particularmente doloroso recordar tudo isto uma vez mais, mas mesmo assim há lições que convém não esquecer.
Chegados à última jornada, o Belenenses liderava o campeonato com 38 pontos, seguido do Benfica, com 37, e o Sporting, com 36. Enquanto o Benfica teria de receber o Atlético, não se prevendo outro resultado que não a vitória dos encarnados, os outros dois grandes de Lisboa teriam de decidir o título, embora as esperanças do Sporting fossem mais que remotas: seria necessário que vencessem o Belenenses e o Benfica perdesse. Por ser improvável a derrota destes últimos o Belenenses, por seu lado, sabia também que teria de vencer.
A impressão geral era assim de que o título dependia inteiramente do desfecho do Belenenses-Sporting, suspeitando os benfiquistas que poderia existir conluio entre os rivais (para mais o Sporting era treinado pelo mítico azulão Scopelli). Como veremos, tal não aconteceu, embora talvez fosse natural na mente de quem está habituado a realizar tais manobras.
A 24 de Abril de 1955 disputaram-se então os dois jogos. Como se esperava o Benfica venceu facilmente o Atlético por 3-0, mas quando terminou esse jogo ainda se decidia o título nas Salésias. E as coisas corriam de feição para o Belenenses, que vencia por 2-1. A euforia reinava nas bancadas azuis, sendo que já se lançavam foguetes. Há quem diga que alguns escarneciam dos sportinguistas acenando com lenços, o que em parte justificaria o que se passaria a seguir. No entanto, não ficaram dúvidas, os foguetes foram lançados antes da festa e qualquer euforia azul ficou marcada para o futuro. Muitos Belenenses ficaram para sempre cépticos e soturnos.
Nos últimos momentos e numa jogada aparentemente simples (e estupidamente consentida) o sportinguista João Martins fez o empate, deixando incrédulos e desesperados os Belenenses. A juntar a isto Matateu marcou um golo que o árbitro entendeu não validar, embora Matateu e todos os outros quantos viram jurarem que o guarda-redes sportinguista tirou a bola de dentro da baliza.
Logo depois terminou o jogo e ficou consumada a tragédia. Muito se falou sobre este jogo, que para sempre ficou a marcar a maior divisão entre os dois emblemas. Marina Tavares Dias, por exemplo, oferece-nos uma perspectiva curiosa, com os depoimentos de adeptos dos dois clubes que assistiram ao desafio. Ao que parece os adeptos sportinguistas não se importavam mesmo por aí além que o Belenenses vencesse, já que gostavam menos ainda do outro rival, o Benfica. Recorde-se que até esse campeonato era o Sporting a equipa dominadora. Desde 45/46 (campeonato ganho pelo Belenenses), só havia perdido um título para o Benfica (49/50), vencendo os 7 restantes.
Disseram porém os sportinguistas que as alegadas zombarias dos adeptos azuis mudaram o estado de coisas, sendo que o despeito e raiva sentiu-se também na equipa.
Por outro lado dizem ainda alguns que o “carrasco” do Belenenses, João Martins, se teria juntado aos jogadores e técnicos do Belenenses no final, também ele em lágrimas, desculpando a sua sentença fatal com sincero arrependimento.
Por outro lado Scopelli assumiu o que tinha transmitido à sua equipa, que nada mais tinham feito que defender a sua camisola honradamente, sem que se justificassem as acusações dos benfiquistas. O seu coração, porém, continuou azul. E para si mesmo jurou que compensaria o seu Belenenses. Quase que conseguiu, com um fantástico 2º lugar em 1972/73, já no meio do marasmo azul que se iniciou ali mesmo, em 1955, vindo-se a agravar nos anos seguintes, com a reentrada em força do Futebol Clube do Porto nas disputas dos títulos e a hegemonia benfiquista da década de 60. Salvo algumas excepções, o nosso Clube começava a ficar de fora do clube dos “grandes”.
Malvadez “lagarta” à parte, o Belenenses deixou escapar outro grande momento de glória, e o Grande Matateu ficou injustamente sem o grande título. Ficou com a parca consolação de conseguir nessa época a sua 2ª Bola de Prata, como melhor marcador do campeonato. O desgosto de Matateu foi o desgosto de muitos Belenenses. Muitos deixaram de acreditar, para sempre. Matateu era o melhor e não ganhámos.

Num tom mais leve, recordamos agora o histórico de resultados. O saldo, reflexo de anos de equilíbrio feroz, só é ligeiramente negativo para o Belenenses. Em 66 jogos, obtivémos 22 vitórias, 19 empates e 25 derrotas, com 97 golos marcados e 102 golos sofridos. Da minha tabela de goleadas para o campeonato (ver a minha página oficial), destaco uns 5-0 em 42/43, 5-1 em 40/41, 4-0 em 67/68 e por fim uns recentíssimos 3-0 em 2001/02, de que falaremos adiante.

De entre os jogos mais recentes, um deles foi também dos mais infames a que assisti, o que diz muito sobre os meus sentimentos em relação a este jogo. Já falaremos dele.
Em 1999/2000 e comandados por Vítor Oliveira sofremos uma derrota por 0-1, sendo o marcador Beto Acosta. No final do jogo o Belenenses merecia ter empatado, mas terminou assim o jogo da 1ª volta com a equipa que seria campeã nesse ano com Augusto Inácio (sim, o tal). Espaço ainda para o jogo da 2ª volta, que terminou com vitória sportinguista por 1 golo, novamente de Acosta. Só que nesse golo o rápido “matador” foi rápido demais, estando em claro fora-de-jogo. O curioso é que a RTP nessa altura apresentava imagens virtuais dos lances polémicos para desfazer dúvidas. E não é que a “máquina” não foi capaz de reproduzir o lance por falta de dados, entre os quais as marcações no relvado de Alvalade? Rir ou chorar, foi verdade!

Em Agosto de 2000 e já com Marinho Peres coube ao Sporting ser o convidado para a apresentação do Belenenses aos sócios. Dessa vez ganhámos por 2-1, sendo que o golo leonino resultou de uma grande penalidade muito duvidosa assinalada por Bruno Paixão (cujas decisões são sempre duvidosas, diga-se). Salvo erro faltaria pouco para a substituição de Inácio por Manuel Fernandes no banco verde e branco.

Já para o campeonato (2000/01) decorreu então o polémico Belenenses-Sporting que contou com a presença do Presidente da República, Jorge Sampaio. Este terá sido convidado pelo Belenenses, julgo eu (não terá ido só por ser o seu Sporting). Antes do jogo verificou-se também uma bonita homenagem aos Campeões azuis de 1945/46 que ainda sobrevivem: José Sério, António Feliciano, Mário Sério, Artur Quaresma, José Pedro e Manuel Andrade. Lembro-me de pedir na ML para que gritássemos “Campeões! Campeões! Campeões”, algo em que a Fúria não falhou. Para lembrar que também já o fomos, naquela noite em que enfrentávamos o campeão em título após 18 anos de jejum leonino.
O Belenenses começou muito bem, com um golo madrugador de Guga aos 4 minutos, empurrando a bola para a baliza após o ressalto no poste a remate de Neca, salvo erro. Um início de sonho. Francisco Ferreira, de Viana do Castelo, encarregou-se do pesadelo. Penalti por assinalar com um inacreditável e descarado “bloco de vólei” dentro da área por parte do jogador Sá Pinto, desviando um remate de livre. Fiquei pasmo, e na própria bancada azul muitos foram os que ficaram calados... de espanto! O jogador azul Cléber, por sua vez, viu um primeiro cartão amarelo já de si duvidoso. O 2º, arrancado pelo “verdadeiro artista” (do mergulho, vocês sabem de quem estou a falar), deu o descabido pretexto para que o árbitro expulsasse o jogador. Um mergulho autêntico! Mas continuando o insólito, o azul Guga sofreu uma entrada violenta por trás – salvo erro do tal Sá Pinto - junto à linha (e ao banco do Sporting). A cacetada foi tal que se ouviu o choque da caneleira na bancada, para além do grito de dôr do jogador azul. O resultado, sem que Guga tivesse sequer protestado, foi um cartão amarelo para... o Guga! Enfim, foi uma noite de aberrações, acabando o jogo com um injusto empate a 1 bola. No final o descontentamento e revolta eram justificados e visíveis. Porém sucedeu-se um episódio a meu ver lamentável. Assisti a um ou dois consócios insultarem o Presidente (sobretudo pela sua ligação ao Sporting), sendo necessária a intervenção policial, ainda que ligeira. No entanto o que mais me revoltou foi a cobertura da comunicação social desportiva que, ignorando e camuflando a roubalheira que ali se passou, exacerbou o episódio do “Presidente” como se tivessem sido mais do que os tais dois consócios e em atitudes violentas. E assim passaram a curiosa imagem de que os Belenenses eram desordeiros e nada civilizados. Bom, pelo que fez, o Sr. Francisco Ferreira bem pode dizer o contrário, pois merecia ficar feito num... pastel.

O jogo de 2001/02 de certa forma compensou o triste episódio de 2000/01, por mérito do Belenenses, claro, pois Martins dos Santos não era um benemérito nosso. Foi a célebre estréia de Boloni, que até nem começou mal: Martins dos Santos assinalou um penalti a favor dos sportinguistas, mas o grande Imperador Marco Aurélio defendeu.
No final, vitória do Belenenses por uns agradáveis 3-0! Como já referimos acima, a última goleada havia sido em 1967/68 (4-0), sendo que por outro lado já não vencíamos o Sporting no Restelo desde 1990 (1-0 com golo do grande Chico Faria). Uma noite de alegria, portanto. Boloni chumbou ao passar na “grelha” do nosso Marinho!

Em 2002/03 o jogo foi tão cinzento como o nevoeiro que grassava no Restelo. Salvou-se um empate a 1 bola, opondo ainda Boloni a Manuel José, já de azul. Infelizmente o Imperador fez o que é tão frequente como o eclipse do Sol, deixou entrar um frango. Depois Rui Borges (agora no malfadado Estrela, como constatámos) marcou um golaço para o empate. Mas o Belenenses, apesar da superioridade numérica pela expulsão de Tello, não conseguiu ir mais além.

Em 2003/04 foi já na “fase da asneira” e com Inácio no nosso banco que concedemos uma derrota trapalhona por 1-3, incluindo uma trapalhona e escusada expulsão de Marco Paulo, desta vez por jogar... basquete. O Sr. Xistra não deixou de dar o seu toque, porém, pois o 1º golo leonino foi precedido de fora-de-jogo, enquanto o jogador Pedro Barbosa só não foi mais cedo para o banho graças ao dito “juiz”. A nossa exibição, no entanto, foi consentânea com a “fase” então em curso.

Do jogo da 1ª volta no WC XXI há a reter a intenção de jogar para o empate (foi como vi) que saíu furada a Carvalhal. Isto embora o 1º golo leonino tenha sido originado num canto que claramente não o foi. Infelizmente acho que o Belenenses podia ter feito muito mais, o nosso adversário estava com uma clara crise “moral”... raramente esteve tão “a jeito”. De reter também mais um insólito da nossa Liga, pois foi instaurado um processo ao Imperador por simulação em clara falta atacante de Liedson. Pese uma certa teatralidade, a falta existiu, pelo que não foi enganado o árbitro e o dito processo, embora esteja aparentemente em aberto, só tenha um caminho, o lixo.

Agora a realidade é um pouco diferente da 1ª volta. O Sporting está claramente moralizado e é unânime que está a praticar o melhor futebol da Superliga. Infelizmente isto são factos. Pode parecer desmoralizador para a nossa equipa, mas por outro lado deveria ser um incentivo extra. Afinal o que valemos nós? Quando é que demonstramos que valemos mais que um 12º lugar?
Apoio a 200% a “luta” contra a Liga, condeno a 200% a discriminação da comunicação social, mas isso tudo não explica o 12º lugar. E mesmo que explique, na melhor das hipóteses colocar-nos-ia num 10º lugar. Sempre é o 10º lugar do objectivo? Eu já estou por tudo, pelo menos cumpram esse. É que às tantas já nem sei se o 12º afinal agrada aos nossos responsáveis.
Não estou com disposição nem tempo para me alongar muito mais, mas uma campanha forte na Taça era a esperança de consolação até dos mais "carvalhistas" (como o nosso Pedro, que sugeriu o caneco como desejo de fim-de-ano para 2005). Agora, foi pelo cano. Sem Taça e em 12º lugar, a época foi pelo mesmo cano. Muitos são os que já nem querem ir mais ao Restelo... Não discuto essa opção (não é a minha), mas quando se fala no Restelo vazio, não se esqueçam. Começou em 1955 e ainda não acabou. Não estou a falar do preço dos bilhetes, da qualidade do espectáculo ou dos entretenimentos “laterais”. Estou a falar daquilo que o Luís Oliveira muito bem resumiu: quando é que voltamos a entrar no Restelo com uma grande certeza que vamos ganhar o jogo em causa? Quando é que valerá a pena fazer quilómetros, sacrificar a vida familiar e profissional, para ter alegrias que compensem tudo isso?
Não peço a cabeça de Carvalhal, peço que haja cabeça para mudar o que se passa quase desde há 50 anos. E não queria entrar muito nas eleições, mas não vejo o que quero e dá título aos meus artigos pré-eleitorais neste blogue: uma mudança da mudança. Vejo duas candidaturas (depois da incorporação da 3ª numa destas) que saíram do rol de dirigentes que já cá estão há anos (uns mais que outros). Uns podem ser mais fortes numas coisas, outros noutras, mas não vejo perspectivas de que mude o essencial.
Não posso estar satisfeito com o desempenho da equipa e do técnico, nem que me lavassem o cérebro. Um 12º lugar como súmula de uma época é mau, muito mau. Mas, entre as melhorias que reconheço já terem existido, continua a faltar muito. E falta porque há quem, apesar da época medíocre, se console com outras coisas. E depois admiram-se que a equipa não tenha mau-perder. E perca.



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